A vegetação da caatinga, característica da região Nordeste do país, prolonga-se na direção Sul ao longo do Rio São Francisco até o norte de Minas Gerais, no município de Januária. Foi lá que iniciamos nossa viagem de duas semanas a este bioma.
A região se caracteriza por uma precipitação pluviométrica média em torno de 600 mm anuais, bem abaixo da do restante do país. Como consequência, abriga uma flora muito diferente dos demais biomas brasileiros. A região, de solos formados a partir de rochas calcárias com grande capacidade de troca catiônica e ótima fertilidade natural, abriga uma caatinga exuberante com árvores de grande porte, ao contrario da maioria das formações deste bioma, sendo por isso teoricamente definida como “floresta xerófita”.
A “barriguda” ou “imbaré” (Cavanillesia arborea) é a árvore mais característica da região, com seu tronco espesso e algo ventricoso. Entre as árvores fornecedoras de madeira destaca-se a braúna-parda (Schinopsis brasiliensis) ainda existente em várias regiões com vegetação de floresta xerófita, cuja madeira é a mais pesada que existe (densidade de 1,23 g/cm³). O Parque Nacional das Cavernas do Peruaçu é a maior unidade de conservação do bioma caatinga, incrustado entre vales, montanhas e rios sobre solos calcários, apresenta uma vegetação bastante diversificada, com formas fisionômicas que compreendem o cerrado lato senso, passando pela mata ciliar até a caatinga propriamente dita com suas várias nuances.
Uma curta visita de coleta a esta unidade de conservação revelou-nos várias surpresas agradáveis. A família aristoloquiácea está representada pelo menos por 5 espécies, das quais Aristolochia pohliana, A. eriantha e A. gigantea são as mais frequentes, esta última já em cultivo nos jardins mais elaborados da região Sudeste, contudo rara na natureza. A família acantácea é talvez a mais bem representada na área e até a família begoniácea (característica de florestas úmidas) foi encontrada, com apenas uma espécie (Begonia exigua), cujo registro é o primeiro para o estado de Minas Gerais. Seguindo agora pelo vale do São Francisco na direção norte, logo alcançamos o estado da Bahia, município de Cocos, onde a primeira surpresa foi o encontro da espécie arbórea rara da família leguminosa Guibourtia hymenaefolia, até então só encontrada na vegetação do chaco do Pantanal, bem na fronteira com a Bolívia.
Como quase todas as espécies de planta que ocorrem no chaco também ocorrem na caatinga, o fato em si já era mais ou menos esperado. Continuando no rumo norte sempre no vale do grande rio, várias trepadeiras extremamente floríferas da família bignoniácea foram se sucedendo. Na altura de Xique-Xique decidimos interromper a caminhada norte para atravessar o rio São Francisco e seguir o rumo leste. Região de grandes carnaubais, o vale do São Francisco no município de Xique-Xique é o mais impressionante pela grandiosidade e beleza cênica.
A mais espetacular descoberta desta expedição saiu exatamente desta imensidão; trata-se de Annona spinescens, um “araticum” vermelho-alaranjado e comestível que há anos procurávamos, bem como os colecionadores de frutas raras de todo o mundo sonhavam cultivá-la. Apesar da época ainda chuvosa, uma das áreas de caatinga mais secas que vimos estava também no município de Xique-Xique. Continuando no rumo leste, logo nos deparamos com a parte norte da Chapada Diamantina, que apesar de estar no bioma caatinga tem uma precipitação pluviométrica um pouco mais generosa que o restante do bioma e, como consequência, aliada a maior altitude, tem também uma composição florística diferente. Logo no inicio do altiplano nos deparamos com a espécie Passiflora luetzelburgii um maracujá raro só encontrado em latitudes mais ao norte deste paralelo. Já na região de Morro do Chapéu mais ao leste, a palmeira acaule Syagrus microphylla é ocasionalmente encontrada.
Neste ponto tomamos o rumo sul, sempre sobre a Chapada, até alcançar a região de Mucugê. Local de muitos rios e grandes rochas, onde a palmeira acaule Syagrus harleyi domina a paisagem, a vegetação predominante é do tipo arbustivo como nos campos rupestres, com muitas canelas-de-ema, begônias, cactos, bromélias e guiaimbês. Os destaques nesta região foram as cores das flores de Evolvulus brevifolius e de Passiflora edmundoi. Continuando agora no rumo sudoeste e deixando a Chapada Diamantina com destino ao norte de Minas para nosso retorno, não poderíamos deixar a Bahia sem antes encontrar mais uma planta espetacular na região de Guanambi; trata-se de Calliandra spinosa – um arbusto de menos de 1 m de altura e de copa com forma perfeitamente arredondada, que até então só havíamos encontrado no litoral norte do Ceará.
Situado na área urbana de Nova Odessa (Região Metropolitana de Campinas, a cerca de 120 km da Cidade de São Paulo – SP), o Jardim Botânico Plantarum é um centro de referência em pesquisa e conservação da flora brasileira. Foi idealizado a partir de 1990, por iniciativa do engenheiro agrônomo e botânico brasileiro Harri Lorenzi.
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